Para as pessoas que estão habituadas à vida na igreja, esta é uma época do ano na qual sobram compromissos e faltam dias disponíveis na agenda. De maneira bem particular, cresci em meio a ensaios de coral, produções cenográficas artesanais, atividades especiais com as crianças, campanhas de ação social e, em casos extremos, até a ceia de Natal dentro da igreja. Esse é o ponto de vista de alguém que lidera e participa mais ativamente das atividades da comunidade. Por muito tempo essa foi a minha perspectiva. Entretanto, minha realidade está mais atrelada ao convívio com outros pastores e pastoras.
Talvez você, pastor e pastora, também esteja nesta correria: além de todas as atividades natalinas, ainda se preocupar em gerar algum conteúdo bíblico para pregações e estudos dentro deste tema. Percebi, desde o início do ministério pastoral, uma preocupação que tira o nosso sono quando chega o Natal.
Existe uma busca pelo inédito, criativo, diferenciado, jamais visto antes. Mas há um muro no qual todas essas ideias batem: a história a ser contada é exatamente a mesma há dois mil anos.
Enquanto refletia sobre este tema, me deparei com a minha própria angústia. Particularmente, gosto muito de contar e ouvir histórias. O universo dos filmes, novelas e séries me encanta exatamente por se tratar de uma grande produção que se baseia em uma narrativa. Agora, te convido a fazer um exercício. Tente se lembrar de algum filme de Hollywood, que gastou milhões de dólares para ser produzido – filme que passou até no cinema e não apenas na Sessão da Tarde – e que era baseado em alguma história bíblica. Pensou? Agora, quantas vezes você fez críticas a essas produções, por não seguirem o “roteiro” bíblico daquela história? Ou por falta, ou por excesso, não ficamos satisfeitos quando os diretores de cinema se atrevem a alterar a narrativa bíblica.
Eu amo ler as histórias bíblicas e imaginar as cenas ali contidas. Eu chego a instigar meus alunos e alunas nos estudos bíblicos promovidos aqui em minha comunidade a imaginarem, construírem rostos, vozes e cenários para as histórias que lemos. Se as histórias bíblicas fossem fielmente retratadas, tenho plena certeza de que seriam sucesso de bilheteria. Mas não é assim que acontece. Como se o relato bíblico já não se bastasse, precisamos inventar algo completamente aleatório para ficar mais interessante. Está conseguindo compreender onde quero chegar?
Nossa angústia esbarra na realidade de que nos consideramos competentes o bastante para “melhorar” a narrativa bíblica do nascimento de Jesus. Não parece um tanto quanto ousado demais de nossa parte? O relato bíblico da chegada do Salvador é estonteantemente perfeito. Cada um de seus detalhes, contados em sua sutileza e simplicidade, enchem o coração dos ouvintes de esperança.
Essa aqui não é uma crítica e muito menos um estímulo à mediocridade na elaboração de pregações e estudos quanto ao tema natalino. Afinal, sabemos muito bem quão desafiadora é a rotina de pesquisa, meditação bíblica e preparação deste tipo de material. A proclamação do Evangelho é um assunto seríssimo e que exige excelência. Exatamente por saber desta responsabilidade que me senti aliviada em deparar com um texto tão completo e rico, como a narrativa do Natal, ao mesmo tempo simples e inspirador.
Meu convite é que possamos sentir palpitar o coração como no anúncio à jovem Maria em Nazaré, tremer as pernas como os pastores nos campos ao se depararem com o coral do exército celestial, marejar os olhos ao contemplar o pequeno bebê Jesus deitado na manjedoura e, quem sabe, sentir cheiro de bicho, de feno, de terra, de sangue. Isso não sou eu que estou inventando, está nas páginas das Escrituras!
Espero que ao invés de sentirmos a necessidade de impressionar (a quem?) com mais uma mirabolante reflexão sobre o Natal, possamos voltar à simplicidade da cena do primeiro natal. Cheio de epifanias, mas também cheio de primariedade. Não é uma narrativa que deve pesar, é o alvorecer da esperança! Que o Príncipe da Paz tranquilize nosso coração, nos lembre que Ele é a melhor a mais importante parte da história. Não apenas da história que contamos em dezembro, mas de toda a História.